sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Indo para Foz do Iguaçu pelas Missões



2009, 25 de julho - saímos eu, a Maria e as crianças, às 9h de casa. Pegamos a Tabaí-Canoas e nos mandamos para a região das Missões. No caminho, passando pela cidade de Tio Hugo, entramos na estrada que vai para Cruz Alta e fizemos um pequeno desvio para entrar em Victor Graeff.


Victor Graeff é um pequeno município no qual a principal atração é a sua praça de ciprestes cortados à moda Edward Mãos-de-Tesoura (quem será que veio antes nessa história?). Em volta desta pracinha, simplesmente maravilhosa, três igrejinhas. E dentro da pracinha, um pequeno museu que estava fechado no sábado - deveriam avisar às secretarias de turismo dessas cidades que turismo se faz, principalmente, nos fins de semana, não é mesmo?

Voltamos para a estrada e seguimos em direção a Cruz Alta. Não tínhamos muita esperança de encontrar o Museu Erico Verissimo aberto, mas a cidade ficava no caminho e estávamos em clima de aventura mesmo. Demos algumas voltas pelo centro, onde, lá pelas tantas, perdemos a indicação do museu na sinalização das placas da cidade - como é mal feita a sinalização no nosso estado, tanto nas cidades como nas estradas. Não achamos o museu; ligamos, ninguém atendeu. Demos adeus ao berço do pai do Luiz Fernando e nos fomos estrada afora novamente. Próxima parada, Ijuí.

A tarde já estava escurecendo e tínhamos reserva no Hotel Spa Fonte Ijuí, um hotel muito bacana - caro, mas muito bacana, com alas de quartos todas em um só pavimento, distribuídas numa espécie de parque natural, cercado por vegetação nativa, rodeado de trilhas, com minigolfe, pracinha, bar, piscina. Muito legal. Comida excelente. Você abre as torneiras do hotel e sente a viscosidade da água mineral, parece que tem gel misturado. Ijuí tem fontes minerais fora do hotel, mas toda a canalização da água nele é feita com água mineral, inclusive o banho, com propriedades medicinais. Descansamos que foi uma beleza. No dia seguinte, o frio tinha deixado uma película de gelo sobre o carro. Friozinho mesmo. Depois de um café da manhã reforçado, o carro bufou todo o frio pra trás e voltamos para a RS-234.

Chegamos em Santo Ângelo (http://pt.wikipedia.org/wiki/Santo_Ângelo) cedo, o sol batia baixo nas torres da Catedral Angelopolitana, construída em pedra grés tal como foram construídas no passado as igrejas das reduções jesuíticas. Impõe-se pesadamente na praça central e não fica devendo, em termos de beleza, a algumas das atrações que vi na Europa. Entrando na catedral, numa manhã de domingo, em meio a uma cerimônia de batismo. Apreciando a pintura novinha, os detalhes ainda coloridos, as esculturas brilhando, tem-se a impressão verdadeira de estar num templo recém construído. E meu amigo, a impressão é verdadeira mesmo. Dá pra se sentir orgulhoso de que, pelo menos em alguns lugares do nosso Rio Grande, a cultura local ainda é valorizada e preservada.


Saindo da Catedral, o programa obrigatório é visitar o museu Municipal Dr. José Olavo Machado, bem ali ao lado. Um primor de museu, que foi a casa de um médico muito famoso na cidade. Aberto domingo de manhã, como convém a quem visita estas cidades no fim de semana. Muito bem recebidos por uma senhora, que desconfio ser a diretora do museu, fomos logo informados sobe o acervo e as características de cada sala, enquanto o Caio já saia filmando o interior do prédio e as peças expostas ... e a Betina, enciumada porque não tinha máquina fotográfica, ia perseguindo-o puxando-o pelo blusão e resmungando atrás. Todas as peças são extremamente bem cuidadas, bem expostas, e logo ali, no pátio do museu, encontra-se um lugar super-agradável pra se tomar um chimarrão e deixar o sol esquentar o corpo. Muito bacana. Se forem lá, não deixem de visitar.

Dali, a dica é ir para outra praça, onde se localiza a sede do sindicato dos artesãos da cidade. Lá tem um pequeno brique nas manhãs de domingo, com artigos de artesanato, roupas, mantas, toucas, brinquedos, toalhas, colchas, redes, um sonzinho rolando ao vivo e a paquera solta em cada canto. Pertinho está a estatua de Sepé-Tiarajú (http://pt.wikipedia.org/wiki/Sepé_tiaraju) e logo mais adiante está o Memorial Prestes, uma estação ferroviária remodelada contendo fotos, painéis, roupas, muita coisa interessante sobre a Coluna Prestes (http://pt.wikipedia.org/wiki/Coluna_Prestes).

Se você tiver preguiça de seguir o link ali atrás, explico rapidamente que a Coluna desbravou o interior brasileiro entre 1925 e 1927, caçada pelos comandos da República Velha e chegou a cobrir 25.000 km (!!!). Lá tem um velhinho muito bacana, extremamente nostálgico dos tempos áureos da ferrovia em que trabalhava. Abriu uma gavetinha, pegou uma chave, abriu o cofre e dali nos deu um papelzinho com o código morse impresso. As crianças cercavam o velhinho para vê-lo manejando o telégrafo e a gente sentia em cada canto daquela velha estação o coração e o amor daquela pessoa por cada tijolo, por cada lembrança, orgulhosa de ter pertencido a um passado heróico e que, infelizmente, provavelmente acabará quando aquela pessoa um dia - que não está muito distante - expirar.

Saindo de Santo Ângelo você retorna para a RS-234 e entra para o eixo principal da rota das Missões. À beira da estrada, quase chegando à redução de São João Batista, vai passar pela Vinícola Fin. Não seja apressadinho, dobre à direita na entradinha e vá conhecer “Seu” Jorge Fin, um abnegado que montou, com ajuda da irmã, uma produção própria de vinhos. Converse um pouco com ele e vai ver que, mesmo com aquela cara de colonão italiano (olha o preconceito!), o cara já fez até pós-graduação em Enologia, recebe excursões para provar a comida típica que ele serve aos domingos (mínimo de 15 pessoas, reservando assento na mesa) e ainda é contratado por diversas universidades para dar palestras sobre o mundo da vitivinicultura. Leve algumas garrafas de vinho, um suco para as crianças e estimule o empreendedorismo do “Seu”Jorge. Faz bem pra ele e pra nós mesmos.


Logo em seguida, voltando à rodovia, pega-se uma estradinha de chão pertinho para conhecer o que restou da redução de São João Batista (http://www.rotamissoes.com.br/_portugues/oQueAtrativosMissoesSitiosBatista.php). Vale a pena curtir a paisagem e imaginar a que ponto de civilização chegaram os jesuítas em seu empreendimento cooperativista (o primeiro do Novo Mundo, em pleno século XVII) e indignar-se com o massacre e genocídio completo dessa gente que mal não fez a não ser acreditar que poderia viver em paz. Fiquei impressionado não só com as ruínas, mas tb com as árvores possantes que dominam o cenário ...quem será que plantou? ... uma vez que elas erguem-se exatamente na linha dos muros que ainda existem .... Conselho importante: não tome água dos bebedouros da administração. A Betina tomou e ficou uns três dias com diarréia.

Dali, o próximo ponto é São Miguel, imagem que permanece na nossa memória visual sempre que se vê uma foto a respeito dos Sete Povos das Missões. Incrivelmente e de uma forma um tanto inesperada, as ruínas da Igreja principal aparecem no meio de uma quadra dentro da cidade, sem qualquer proteção aos monumentos espalhados sobre a grama, a não ser um que outro guardinha um tanto relapso. O fato é que a criançada fica subindo nas paredes, nos muros, caminha sobre os tijolos ancestrais e, se quisesse, poderia até levar uma “lembrancinha’ pra casa “na moita” .. impossível controlar tanta gente ... e isso que nem havia tantos turistas nessa época de paranoia gripal ... Fiquei pensando no museu arqueológico de Barcelona, onde se caminha sobre estrados de madeira e olha-se as ruínas através de paredes de vidro e, em nenhum momento é permitido ao visitante sequer tocar nos materiais antigos. É, ainda temos muito a aprender com o Velho Mundo ...

Nos instalamos no Wilson Park Hotel. Quarto gigantesco, quádruplo. Um luxo. Mas a TV detonada por um raio e um problema na caldeira nos fizeram mudar pro quarto ao lado. Ora bolas ... porque nos deixaram instalar ali, então ? Como o hotel estava praticamente vazio, imaginamos que alguém teria desistido por causa da Gripe A e então nos liberaram para o outro quarto. Mesmo assim, a TV só pegava a RBS ... mas quem estava ali pra assistir TV? À noite nos entrouxamos todos para o frio e nos mandamos pra ver o tal do “Espetáculo de som e Luzes”. Depois de 15 minutos sentados no escuro, ouvindo aquele palavreado tipo “Ó vós que adentrai na mata, persigai os rudes nativos da mata, embrutecidos pela noite dos tempos ...”, olhei para a Betina, que não estava entendendo nada do assunto. O Caio ainda tinha aprendido alguma coisa sobre as Missões no colégio, mas aquele rebuscamento todo era realmente muito chato ... deveriam modernizar um pouco o texto, antes que a juventude desista de assistir ao espetáculo. Quando as luzes começam a acender e “dialogar” junto com a mixagem dos sons até que fica interessante, mas não mais do que uns vinte minutos. Pensei: até que poderiam fazer umas esculturas do Sepé Tiaraju, dos comandantes, do exército, dos índios, etc e acender as luzes conforme os diálogos e a narrativa .. sei lá, acho que ficaria mais dinâmico, interessante ...


Dormimos em São Miguel e pela manhã seguimos viagem para São Luiz Gonzaga, onde fica a redução de São Lourenço Mártir, local da primeira siderúrgica das Américas e que teve o destino terrível dado a todas as reduções jesuíticas: massacre e destruição. Fomos dali para São Nicolau rodando por estradinhas estreitas e esburacadas, nas quais é difícil avistar caminhões, muito menos carros. Em São Nicolau resolvemos um problema com o nosso cartão do BB (onde quer que vc vá, nestes confins do Brasil, vai encontrar uma agência do Banco do Brasil ... aliás, não lembro de ter visto Caixa Federal nestes fins de mundo, mas vi muita agência da Sicredi). As ruínas de São Nicolau ficam numa praça central e mais uma vez senti falta de uma proteção mínima para os destroços das construções, um mínimo senso de preservação daquele tesouro arqueológico, no qual provavelmente as crianças brincam escalando as paredes e muros ancestrais e quem sabe até levando pedaços pra brincar em casa, na escola, no mato ... até quando vai existir o que visitar é uma boa pergunta. Carros e caminhõezinhos feitos à mão eram uma constante na cidade. Uma hora nos perdemos e fomos dar num casarão fantástico antiquíssimo ... Impressionante mesmo, uma sensação de ter atingido uma espécie de fim do mundo me invadiu, talvez pela inexistência de tráfego nas rodovias ... meio assustador, não gostaria de viajar à noite ali ...


Até São Miguel tínhamos programado os hotéis, mas a partir dali era pura aventura. De São Nicolau, de onde saímos depois do almoço, começamos a subir em direção à Foz do Iguaçu. E não tinha nenhuma estrada em linha reta, estávamos numa das regiões mais ermas do estado. Em direção a Santa Rosa, com uma péssima sinalização nas estradas, algumas vezes precisávamos entrar na cidade para seguir na rota principal, às vezes era preciso seguir por outro caminho.E mais de uma vez, tivemos que voltar porque tinhamos pego o caminho errado. Assim, tateando, indo-e-voltando, perguntando, quase fomos parar em Porto Mauá, fronteira com a Argentina. Voltamos. Nos indicaram ir por Três de Maio, Três Passos, e quando anoiteceu estávamos chegando a Tenente Portela. Em Tenente Portela achamos o Salto Grande Tourist Hotel, do “Seu” Carlinhos, uma figuraça. O cara arranjava tudo pra nós ... eu queria tomar um vinho, mas o hotelzinho só tinha cerveja. O que que ele fez? Saiu comigo, andamos uma quadra, chegamos numa fruteira que já estava fechada ... ele bateu, o dono abriu e voilá! Saí dali com uma garrafa de DOIS LITROS DE VINHO, por R$ 8,50 ... e eu iria dizer que não queria aquele vinho vagabundo ... hehehe ... eu não, depois de todo o esforço do Carlinhos eu é que não iria negar .. tomei uma taça daquele vinho no quarto, joguei o resto pra formigas sem ninguém ver e fique bem faceirinho ... hahahahah ...Era um hotelzinho fuleirinho, mas o “Seu” Carlinhos arranjava tudo que a gente precisava .. até internet pro notebook ele abriu, liberando de graça a rede do hotel. O Seu Carlinhos nos avisou que o Salto do Yucumã (http://www.turismoyucuma.com.br/?pg=o-salto), a grande atração da região, estava sem graça, porque o rio estava cheio demais, escondendo o desnível entre suas margens, que é a grande curtição internacional (são 1,8 Km de quedas d’água, o que o torna o maior salto em comprimento do mundo) do Parque do Turvo. Já sabíamos, então, que não valia a pena passar por ali na volta de Foz.


Na manhã seguinte, passamos por Frederico Wetphalen, que, à distância, vista pela RS-168, me pareceu uma metrópole crescida demais, um tanto sinistra, para o meu gosto. Naquela região tinha tráfego muito pesado, caminhões, tratores, carretas, muitos subindo em direção a Santa Catarina e, por isso, deixando o asfalto completamente estraçalhado nos últimos quilômetros entre o Rio Grande e Santa Catarina. Cruzando a enorme ponte sobre o rio Uruguai e chegando ao lado catarinense é como se a gente deixasse de caminhar por sobre um chão de pedras, buracos, desníveis, trechos e trevos extremamente mal sinalizados, para passar a andar sobre um tapete impecável de asfalto. E quando chegávamos a um trevo catarinense, sempre existia pelo menos uma placa indicando qual a próxima cidade, qual vinha depois dessa e a distância entre elas. Que inveja! E NENHUM PEDÁGIO nos foi cobrado em qualquer lugar em SC ou PR até a cidade de Foz do Iguaçu.
































































































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